segunda-feira, 22 de março de 2010

Perspectivas de ensino para a fundação casa lar mediante um olhar restaurativo

 GEPI – Grupo de Estudo e Pesquisa sobre a Interdisciplinaridade

Docente: Ivani Catarina Arantes Fazenda
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Discente: Caterina Casaretti

Trabalho de estudo: Perspectivas de ensino para a fundação casa lar mediante um olhar restaurativo

Nos atuais dias, quem é professor percebe que o grau altíssimo de violência nas salas de aula já se inicia desde a tenra idade.
Não é possível refazer este país, democratizá-lo, humanizá-lo, torná-lo sério, com adolescentes brincando de matar gente, ofendendo a vida, destruindo o sonho, inviabilizando o amor. Se a educação sozinha não transformar a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda. (FREIRE, 1996, p. 45).
Acredito que para revertermos esta situação é preciso fazer um trabalho extremamente massivo que envolva filhos, pais, comunidade, igrejas, professores, associações de bairro e demais órgãos representativos que exercem força democrática na sociedade.
Não se constrói a autonomia da escola senão mediante um entendimento recíproco entre dirigentes do sistema e dirigentes escolares entre estes e a comunidade escolar (incluindo pais) a respeito de que tipo de educação a escola deve promover e de como todos, em conjunto, vão agir para realizá-la. Não se trata, portanto, de um processo de repartir responsabilidades, mas de desdobrá-las, ampliando-as e compartilhando-as (Lück,2000,p. 250).
Partindo de um olhar onde o meio nos influencia, o influenciamos e cabe a cada ser buscar o que vem a ser uma pedagogia salutar.
Existem sistemas fechados e sistemas abertos. O sistema fechado não cria relação com o meio e tende à entropia e, consequentemente, à morte, o sistema aberto, ao contrário, mantém constante interação com o meio, e assim, a partir do conceito de retroalimentação, está sempre em mudança e numa constante troca com o meio, pois interfere no meio e também é afetado por ele. (Mariotti, 1995, p. 71-72).
Não se pode reformar a instituição sem uma prévia reforma das mentes, mas não se pode reformar as mentes sem uma prévia reforma das instituições. (Edgar Morin)
Projetar significa tentar quebrar um estado confortável para arriscar-se a atravessar um período de instabilidade e buscar nova estabilidade em função da promessa que cada projeto contém de estado melhor que o presente (Gadotti, apud Sousa, 2002, p. 72).
E como afirma Proust:
Uma verdadeira viagem de descobrimento não é encontrar novas terras, mas ter um olhar novo. (Apud Morin, 2000, p. 07).
Daí a importância de um pensamento que evolua o nosso comportamento. Não basta o interno ter um tratamento saudável se os seus familiares sobrevivem em um grau de exploração humana muito elevada. Cuidar da educação e educar a ação; um trocadilho simples que reflete um conteúdo vasto e complexo. Como partir do caos à ordem? Se é que é esta a ideia, pois se é complexa compreende a desordem.
É preciso saber caminhar entre as brechas como a nossa orientadora Ivani Fazenda coloca.
Brechas da lei, brechas do regimento, brechas nos costumes e tradições, brechas de comportamento, resgatar o ser, dar-lhe dignidade e auto-estima, educando-o propriamente com um olhar libertador que o situe e o objetive na existência.
A maior parte das propostas de mudança social, entretanto, parte da falsa suposição de que grandes mudanças ocorrem a partir de grandes ações; que o benefício da mudança deve excluir grupos considerados não pertinentes, e a isso se junta o compreensivo desejo de que as mudanças nos atinjam e nos beneficiem ainda em nosso tempo de vida – com grandes e rápidas mudanças introduzimos tantas variáveis, simultaneamente, no sistema, que seria surpreendente se o resultado atendesse às nossas expectativas. Mas, as pequenas mudanças podem ser extremamente gratificantes por construírem um espaço próximo de convivência, sem que se espere sacrifícios ou heroísmos, próprios de instituições dogmáticas, de movimentos violentos, governos autoritários e anti-sociais (Andrade 2003, p. 20).
Saber captar o talento dentro de um olhar maltratado.
Não há casos perdidos, apenas a incompetência de si mesmo de não se deixar exercer a beleza de um ser e viciar-se em estados baixos de animo que só levam a trevas e mais trevas.
Começando pelo ambiente, não se pode educar num ambiente opressor, há de existir uma forma de diálogo que o faça restaurar-se como ser, se destruiu, construa, se espancou cuidará de suas feridas a exemplo.
O respeito ao outro e a si mesmo e o compartilhar dos resultados são características da educação, e seu método é invariavelmente o conversar, o comunicar, o dialogar (Andrade 2003, p. 20).
Sabemos que não é tão simples assim, que existem pessoas que nascem com uma carga genética que estimulam a violência, porém se não é pela educação não será por nenhum outro caminho.
A aquisição de uma consciência mais amorosa por parte dos envolvidos refletirá em situações mais harmônicas, como tornar possível um ambiente saudável?
A criação de ambientes participativos é, pois, uma condição básica da gestão democrática. Deles fazem parte a criação de uma visão de conjunto da escola e de sua responsabilidade social e a maximização de aptidões e competências múltiplas e diversificadas dos participantes; o desenvolvimento de processo comunicação aberta, ética e transparente. Esse ambiente participativo dá ás pessoas a oportunidade de controlar o próprio trabalho, ao mesmo tempo em que se sentam parte orgânica de uma realidade e não apenas apêndice da mesma ou um mero instrumento para a realização dos seu objetivos institucionais (Lück,2000, p. 27).
Partindo da infra à supra à estrutura e as suas interpretações de base, terá que haver um estímulo maciço à amorosidade, respeito às integridades, físicas, psicológicas e de conhecimento. A palavra é aprender a conviver. Se não houver este trabalho de projeto político pedagógico não poderá criar as situações necessárias para a mudança.
Há uma idéia de senso comum, inclusive de muitos pedagogos de que a pedagogia é o modo como se ensina, o modo de ensinar a matéria, o uso de técnicas de ensino. O pedagógico aí diz respeito ao metodológico, aos procedimentos. Trata-se de uma idéia simplista e reducionista. (Libâneo, 2002, p. 29).
O pedagógico refere-se a finalidades da ação educativa. Nesse entendimento, o fenômeno educativo apresenta-se como expressão de interesses sociais em conflito na sociedade. É por isso que a pedagogia expressa finalidades sócio-políticas, ou seja, uma direção explícita de ação educativa (Libâneo, 2002, p. 30).
Se um ser não é tratado com um ser respeitável, como poderá refletir aquilo que aprende?
O aluno aprende apenas quando ele se torna sujeito da sua aprendizagem. E para que ele se torne sujeito da sua aprendizagem precisa participar das decisões que dizem respeito ao projeto da escola que faz parte também do projeto de sua vida. Passa -se muito tempo na escola para serem apenas clientes dela. Não há educação e aprendizagem sem sujeito da educação e da aprendizagem. A participação pertence à própria natureza do ato pedagógico. (Gadotti, 2000, p.36).
Como reverter um colapso que existe no mundo há milênios?
Consideramos que não é possível pensar o futuro da escola se continuarmos satisfeitos com explicações parciais e fragmentadas da participação, da educação e principalmente da ciência, como se ela  desse conta da nossa realidade e como se fosse admissível continuar a deixar de lado aquilo que consideramos de difícil explicação porque relacionando à emoção, à sensibilidade, a subjetividade e não simplesmente à razão  ao quantificável ao mensurável (Padilha, 2003, p. 100-101).
 A política restaurativa deveria considerar a exclusão dessas famílias que estão totalmente degradadas pelas políticas públicas desonestas e insatisfatórias. Se quisermos realmente modificar algo é preciso saber de onde vem o problema.
Acredito que o passo inicial deve ser o sincero empenho de todos que se interessem pela melhoria da educação no sentido do estabelecimento de um clima de valorização incondicional da pessoa humana. Essa é a condição inicial e necessária para o surgimento de pessoas seriamente empenhadas no exercício da liberdade e da responsabilidade próprias (Silva, 1996, p. 118).
E de onde vem? Vem de mim, de ti? Trabalhar a educação como um todo não desconexo, aprofundar as causas que nos levaram a tanto sofrimento.
Foi o olhar, foi a atitude, a ausência, a intolerância?
Como afirma Santos:
O indivíduo atual é sincrético, isto é, sua natureza é confusa, indefinida, plural, feita com retalhos que não se fundam num todo.
O que resulta na descrença e na falta de esperança no futuro.
Se bloqueamos os pensamentos a tal ponto de retrocedermos em nossos comportamentos é aceitável se houveram danos nos relacionamentos e nas circunstâncias em que por acaso sofremos de acordo com um pensamento dentro de um conceito complexo, não importa de quem é a culpa, o condenar, o julgar e sim o restabelecer de uma harmonia dialógica, se for pela arte, ou pelo conhecimento de outras possibilidades de caminhos para uma existência menos rude, e desta maneira  não precisaremos mais pensar que o mundo não é farto, nós é que o escasseamos.
O desenvolvimento tecnológico e o surgimento de uma sociedade de consumo baseada nas leis selvagens do mercado surpreendem o sujeito que, desintegrado e sem tempo para si mesmo, procura juntar pedaços de informações desconexas entre si, em busca de algum sentido. (SHIMIDT NETO, 2007, p. 107).
Como ressalta Freire sobre o homem moderno:
Não sabe o que quer, o que pensa e sente. Ajusta-se ao mandado de autoridades anônimas e adota um eu que não lhe pertence. Quanto mais procede deste modo, tanto mais se sente forçado a conformar a sua conduta à expectativa alheia. Apesar de seu disfarce de iniciativa e otimismo, o homem moderno está esmagado por um profundo sentimento de impotência que o faz olhar fixamente e, como que paralisado para as catástrofes que se avizinham (Fromm Apud Freire, 1980, p. 44).
Nós o engessamos, tornamos fraco e doente, daí a importância de um salto na qualidade do estar no mundo com os outros e pelos outros como um resgate de nós mesmos.
Partindo da simplicidade:
Quais são os verdadeiros valores que tem uma verdadeira importância
O que é ser verdadeiro, íntegro, justo?
A quem interessa a justiça que presenciamos?
Qual é realmente a repercussão democrática em nossa história?
Aprender a ser humano, a ter um olhar complacente que desvele a dureza de tanto descaso histórico.
Se não optamos pela mudança de um paradigma que sempre se torna rígido no decorrer do processo, que venha uma alternativa flexível, ecossistêmica como sustenta Maria Cândida de Moraes.
O processo educacional deve levá-lo a desenvolver uma atitude construtiva, uma competência construtiva, modos construtivos de conceber, fazer e compreender, uma prática adequada para a produção de conhecimento. (MORAES, 2000, p. 199).
O poder atual está nas teias de relações representada pelo conjunto de informações e conhecimentos disponíveis nos poderes da mente sobre a força bruta, o que, em última instância, significa que o poder está sendo transferido para o ser humano, indivíduo, compreendido como um ser de relações, como tudo o que está na natureza. (MORAES, 2000, p. 210).
Uma pedagogia da autonomia como sustenta Freire, que perceba que não há ser que não possa aprender.  E:
“Uma das tarefas mais importantes da prática educativo-crítica é propiciar as condições em que os educandos em suas relações uns com os outros e todos com o professor ou com a professora ensaiam a experiência profunda de assumir-se. Assumir-se como ser social e histórico, como ser pensante, comunicante, transformador, criador, realizador de sonhos, capaz de ter raiva porque capaz de amar. Assumir-se como sujeito porque capaz de reconhecer-se como objeto” (FREIRE,1997,p.46). 
O respeito à autonomia e à dignidade de cada um é um imperativo ético e não um favor que podemos ou não conceber uns aos outros. (FREIRE, 1996, p. 59).
Se as plantas são capazes de se adaptar aos lugares mais inóspitos e de maneira saudável, daí a chave para uma postura coerente de ensino, aprender a lidar com o caos e se possível dar-lhe um olhar mais sensível a verdadeira beleza do existir como objetivo sagrado de todo ser mediante sua transposta complexidade.
O Resgate do valor humano é de extrema importância para que possamos realmente trilhar por um caminho menos doloroso. Para que não precisemos viver dentro de prisões e fugindo de nós mesmos.
A educação deve conduzir o sujeito ao encontro de si mesmo, por isso a importância da autonomia. (SHIMIDT NETO , 2007, P.51)
Que possamos ter uma razão de existir fundamentada na amorosidade como ponte à lucidez coletiva. Se precisamos utilizar recursos, que estes sejam recursos saudáveis que favoreçam à libertação das ilusões o que fortalece a interdisciplinaridade.

Referências Bibliográficas
ANDRADE, Arnon A. M. de; “complexidade e comunicação” In: GALENO, Alex; CASTRO, Gustavo de; SILVA, Josimey Costa da (Orgs.) Complexidade à flor da pele: ensaios sobre Ciência, cultura e comunicação, São Paulo Cortez, 2003.
FREIRE, Paulo; Educação como prática da liberdade. 17ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra,1979.
________. Pedagogia da Autonomia. 25ª ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1996. 
________. Pedagogia do oprimido. 17ª ed., Rio de Janeiro, Editora Paz e Terra, 1987.
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MORAES, Maria Cândida de; Paradigma educacional emergente, 6 ed., Campinas, SP, Ed. Papirus, 2000.  
MORIN, Edgar; Os sete saberes necessário à educação do futuro, São Paulo, Cortez, Ave Maria, 1981.
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________. O método: a humanidade da humanidade a identidade humana Porto Alegre, Sulina, 2003.
________. Meus demônios, Rio e janeiro, Bertrand Brasil, 1997.
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________. “A noção de sujeito”, In: SCHIMITMAN, Dora Fried. (Org.) Novos paradigmas, cultura e subjetividade, Porto Alegre, Artes médicas, 1996.
MORIN, Edgar e BAUDRILLARD, Jean; A violência do mundo, Rio de Janeiro, Anima Editora, 2004.
PADILHA, Roberto Paulo; Planejamento dialógico, 4 ed. São Paulo, Ed. Cortez, 2003.
PADILHA, Roberto Paulo e ROMÃO, José E.; Planejamento socializado ascendente na escola In GADOTTI, Moacir / ROMÃO, José E. Autonomia da escola: princípios e propostas, 5 ed. São Paulo: Cortez, 2002.
SANTOS, Boaventura de Sousa; A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência, São Paulo: Cortez, 2001
SANTOS, Jair ferreira dos; O que é pós moderno, São Paulo, Ed Brasiliense, 22 ed. 2004.
SILVA, Jair Militão. Autonomia da escola pública, 6 ed. Campinas, Papirus, 1996
SHIMIDT NETO, Álvaro A.; Educação e complexidade – A construção do projeto político pedagógico, Ed. Cabral Universitária, Taubaté, SP, 2007.
SOUSA, José Vieira e CORREA, Juliane. Projeto pedagógico: a autonomia construída no cotidiano da escola: In: VIEIRA, Sofia Lerche (Org.) Gestão da escola: desafios a enfrentar, Rio de Janeiro: DP&A, 2002.

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